No último mês de agosto, o Terreiro de Òsùmàrè abriu suas portas para render homenagens em agradecimento e louvor ao patrono do Egbe, nosso Pai Òsùmàrè e aos outros Òrìsás associados a terra, como Yewá, Òmolú, Ìrokó, Ossaín, e Nanã. O ciclo de cerimônias, que foi realizado duranto todo o mês, reafirma o propósito iniciado pelos nossos ancestrais, que plantaram a rica tradição do culto aos Deuses Africanos, conforme afirma nosso líder, Baba Pecê.
"O Terreiro de Candomblé é um espaço de reconstrução familiar, resgate religioso e cultural. Nossos antepassados africanos desembarcaram no Brasil, na pior condição humana já existente, que é a condição de escravisados. Os separaram de suas famílias e de seus costumes, numa busca de apagar de sua memória, as suas tradições. Mas, foi por meio do Candomblé e dos Òrìsàs, que esses africanos construíram uma nova família, resgatando tudo aquilo que lhes roubaram. Desse modo, o Candomblé tornou-se uma confraria de resistência, onde um ajudava o outro e juntos, professavam sua religiosidade e reviviam sua cultura. O Asè foi o alimento para as suas almas e a esperança de reverter a situação".
Preservando a tradição, trazida por nossos ancestrais, reverenciamos nosso Pai Òsùmàrè. Os rituais foram iniciados muito antes do dia da grande cerimônia pública. Para a comunidade do Terreiro de Òsùmàrè, cada etapa é cercada de costumes, desde a escolha dos animais, de cada alimento que foi ofertado aos Òrìsàs, etc. Leandro Dias, Baba Egbe da Casa, comenta:
"Tudo foi escolhido com muito amor e em conformidade aos costumes tradicionais do Terreiro. Nosso Babalòrìsà frisou a cada momento, que nossa grande missão é preservar os costumes centenários da nossa casa, por isso, para nós é sempre uma grande satisfação ver nossos mais velhos reunidos, que mesmo com a saúde um pouco debilitada, não mediram esforços para louvar Òsùmàrè, para mim, isso é uma grande prova de fé e amor. Da mesma forma, é uma grande emoção ver as Iyawo em procissão, carregando a sagrada água da fonte, para poder cultuar o nosso patrono. A imagem delas desde a fonte até o alto da colina é algo que jamais vou apagar da minha mente. Todos os rituais foram cercados de muita tradição".
No dia 17.08, o dia da cerimônia pública, a comunidade foi acordada com a alvorada. Uma grande queima de fogos,acompanhada dos Ogans do Terreiro que salvaram a casa com a sequência de toques em louvor aos Deuses, anunciava o ínicio das obrigações. De fato, cada momento trazia-nos à mente que nossa religião é cercada de rituais. Os Ogans compenetrados ao ir à mata para colher as folhas sagradas, como as de Ewe Alekesi (São Gonçalinho), que forraram o barracão festivo, emanando Asè nos pés de todos que sobre elas dançaram. O odor apaziguador da defumação que pairava em cada parte do Terreiro, o aroma do banho de ervas que cada Omo Òrìsà se purificou para salvar Òsùmàrè. No compartilhar das refeições sem distinção, respeitando apenas a hierarquia dos mais velhos serem servidos primeiro. Das cerimônias mais simples as mais complexas, nosso alma se alimentou de força, esperança e ƒé, assim praticávamos ali o Candomblé, tradicional e familiar.
Foram inúmeros momentos especiais, mas no sábado dia 17, ainda pela manhã lágrimas de emoção foram arrancadas da comunidade. Após o tradicional desjejum dedicado aos filhos do Asè, onde mais de 300 irmãos comungaram em regozijo numa farta mesa. As anciãs juntamente com o Babalòrìsà Pecê, se dirigiram rumo à árvore dedicada a Azanaodo é aos seus pés, fizeram a evocação a grande serpente. Após os ritos, começaram a entoar milenares cânticos e bem vagarosamente foram subindo as escadarias em direção a Casa de Òsùmàrè, no auto da colina, trazendo em suas mãos, as oferendas e instrumentos para ofertarem aos nossos Deuses. Foi um momento único que palavras não podem traduzir, os Òrìsàs se fizeram presente, distribuindo Asè. A comunidade estava em alegria.
Antes de anunciar as determinações do grande patrono, a Ìyá Efun do Terreiro, Beth de Òsàlá afirmou que a comunidade estava no caminho certo, seguindo as orientações dos òrixas. "Òsùmàrè de Baba esta muito feliz, ele disse a mim que estamos no caminho certo, mas deixou ordem para Baba Pecê não abrir guarda do trabalho que vem fazendo, que é dever dele preservar o Asè. E que ele está certo em cobrar e conscientizar que devemos manter as tradições como eram antes", relatou a agbá.
Para a comunidade, as palavras do Patrono, fomentam que todo o trabalho de conscientização sobre os costumes devem ser mantidos. Pai Pecê, vem seguindo com garra e preocupação, buscando de todas as formas elucidar os costumes e preservar a tradição hierárquica.
Ogan mais velho de toda Bahia, e que assume o cargo de Elemàsó do terreiro, Erenilton Bispo dos Santos não escondeu a emoção ao participar da festa. "Estou muito emocionado em ver Pecê, meu sobrinho, e atual babalorixá desta Casa, dar continuidade as coisas que minha mãe Simplícia fazia. Ele coloca ordem na casa e mantém o respeito. Estou orgulhoso, ele ouviu meus conselhos, a Casa esta linda cada dia melhor muito axé", afirmou Ogan Erenilton,apos ter recebido uma linda homenagem em virtude dos prestimos e dedicação ao Terreiro.